"Igualdade monstruosa"
Para aqueles que advogam a igualdade monstruosa que todos reduz a um mesmíssimo nada, e que o fazem do alto dos seus cargos de ilustres dignatários de um qualquer país com assento nesse organismo caricaturalmente supranacional, cada vez mais convertido em arauto e refém da igualdade monstruosa, da caridadezinha, da corrupçãozinha, dos votos de alguns, das pretensões de muitos e do descaso de todos, fica isto:
“Theodor Busbeck pegou num dos livros que tinha à sua frente e leu:
«(…) seis milhões de seres humanos foram arrastados para a morte sem terem a possibilidade de se defender e, mais ainda, na maior parte dos casos, sem suspeitarem do que lhes estava a acontecer. O método utilizado foi a intensificação do terror. Houve, de começo, a negligência calculada, as privações, a humilhação. Veio a seguir a fome, à qual se acrescentava o trabalho forçado: as pessoas morriam os milhares, mas a um ritmo diferente, segundo a resistência de cada um. Depois, foi a vez das fábricas da morte e todos passaram a morrer juntos: jovens e velhos, fracos e fortes, doentes ou saudáveis; morriam não na qualidade de indivíduos, quer dizer, de homens e de mulheres, de crianças ou de adultos, de rapazes e de raparigas, bons ou maus, bonitos ou feios, mas reduzidos ao mínimo denominador comum da vida orgânica, mergulhados no abismo mais sombrio e mais profundo da igualdade primeira: morriam como gado, como coisas que não tivessem corpo nem alma, ou sequer um rosto que a morte marcasse com o seu selo. (…) É nesta igualdade monstruosa, sem fraternidade nem humanidade – uma igualdade que poderia ter sido partilhada pelos cães e pelos gatos – que se vê, como se nela se reflectisse, a imagem do Inferno.»”
De Gonçalo M. Tavares, in Jerusalém
“Theodor Busbeck pegou num dos livros que tinha à sua frente e leu:
«(…) seis milhões de seres humanos foram arrastados para a morte sem terem a possibilidade de se defender e, mais ainda, na maior parte dos casos, sem suspeitarem do que lhes estava a acontecer. O método utilizado foi a intensificação do terror. Houve, de começo, a negligência calculada, as privações, a humilhação. Veio a seguir a fome, à qual se acrescentava o trabalho forçado: as pessoas morriam os milhares, mas a um ritmo diferente, segundo a resistência de cada um. Depois, foi a vez das fábricas da morte e todos passaram a morrer juntos: jovens e velhos, fracos e fortes, doentes ou saudáveis; morriam não na qualidade de indivíduos, quer dizer, de homens e de mulheres, de crianças ou de adultos, de rapazes e de raparigas, bons ou maus, bonitos ou feios, mas reduzidos ao mínimo denominador comum da vida orgânica, mergulhados no abismo mais sombrio e mais profundo da igualdade primeira: morriam como gado, como coisas que não tivessem corpo nem alma, ou sequer um rosto que a morte marcasse com o seu selo. (…) É nesta igualdade monstruosa, sem fraternidade nem humanidade – uma igualdade que poderia ter sido partilhada pelos cães e pelos gatos – que se vê, como se nela se reflectisse, a imagem do Inferno.»”
De Gonçalo M. Tavares, in Jerusalém
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