terça-feira, maio 10, 2005

Atraso habitual

Quem me conhece sabe que me atraso recorrentemente. Durante muito tempo fi-lo angustiado, hoje assumi que não é propriamente uma falha, é antes um excesso de diligência em tudo o que preciso fazer antes de honrar o compromisso assumido, seja passear o cão ou ver televisão.


Mas como a sabedoria popular é soberana, mais vale tarde que nunca!
Dizia a minha amiga INF que o meu igualmente amigo LTN acha que as mulheres devem ser encarceradas quando fazem um aborto...
Não sei se estas foram as suas palavras, mas gostava de acreditar que não.
Eu não sou a favor da despenalização do aborto (pronto já disse!), mas também não me considero porta-voz de nenhum grupo, comunidade, organização ou civilização, logo não me sinto legitimado para condenar ou deixar de condenar quem não concorda comigo.
Se sou a favor da penalização do aborto tal como está? Sim, sou. (agora também já ‘tá!).
Todavia, como é óbvio, não pretendo com isto dizer que as mulheres que sofrem uma interrupção voluntária da gravidez (IVG) devam ser "encarceradas"... aqui não há quereres.

Eu acredito que a IVG é um trauma tremendo para o corpo e para o espírito. No entanto, se a IVG for bem executada o corpo sofre pouco ou quase nada (não interessa aqui discutir se é assim por ser feito em Espanha ou não, é uma tolice, há clínicas a fazer IVG em Portugal tão bem como o Ibérico faz implantes mamários!), o que a qualidade da intervenção não diminui é o trauma do espírito ou, se preferirem, o trauma psicológico.
Para mim a IVG, quando precedida de um trauma psicológico (em sentido amplo, sff) cai naturalmente num dos casos que excluem a ilicitude ou a culpa previstos no Código Penal. Assim, uma senhora, rapariga ou criança que sofra uma IVG, avaliado que é o caso concreto no Tribunal, acabaria por não vir a ser propriamente condenada.
A questão torna-se, para mim, mais complicada nos casos em que, por falta de respeito pelo próprio corpo e pela fecundação ou gestação (dependendo do credo ou opinião) enquanto criadoras de vida, uma rapariga ou senhora (as crianças são inimputáveis) resolve fazer da IVG a sua forma preferencial de planeamento familiar. Aí, estou plenamente de acordo que deveriam ser condenadas. Contudo, é importante ter presente que uma condenação não implica necessariamente uma medida privativa da liberdade. A Arguida pode ser condenada em multa ou receber uma suspensão da pena privativa da liberdade, ou melhor ainda, pode ser condenada em trabalhos em prol da comunidade, por exemplo em centros de apoio à grávida ou à criança. Caso a grau de culpa seja considerado diminuto e atentas as circunstâncias, a Arguida pode mesmo receber uma simples admoestação do Tribunal.
Quanto à questão do celebérrimo cadastro, bastaria um simples requerimento para que este crime não ficasse inscrito no mesmo, com o fundamento de foro da vida privada e sujeição a um estigma completamente desnecessário para o cumprimento do fins a que o Direito Penal se propõe.
Importa falar da co-autoria, e da pobre da senhora enfermeira ou médico que executam a IVG... coitadinhos, ganham 200 ou 500 € pela maçada. Fazem-no com o mais completo desrespeito pela vida que pelo menos o segundo jurou proteger e a primeira tem pelo menos o dever de não ofender. O único objectivo dessas pessoas (sob pena da análise in casu) é obter uma vantagem patrimonial, muitas vezes colocando em risco a saúde da paciente.


Para finalizar, esta conversa toda vale o que vale, ou seja nada!Como disse em cima não represento nada nem ninguém, muitas vezes nem sequer a mim me represento, mas confesso que nesta altura do campeonato acho não se pode alterar uma lei que tanta volta tem dado na opinião publicada sem se consultar a opinião pública. Aquela que há uns anos atrás decidiu maioritariamente pelo não ou, numa clara demonstração da tolice que era modificar o que está bem... nem sequer saiu de casa ou mudou planos para votar no que quer que fosse. Segundo a minha óptica nesse referendo a resposta não foi um não, foram dois!