sexta-feira, março 11, 2005

"Onzes"

Enquanto lia este excelente post recordei-me da sensação esmagadora que foi ouvir narrar o que aconteceu em Madrid no dia 11 de Março na primeira pessoa e por duas vezes em ocasiões completamente diferentes.
Fui a Madrid passar um fim-de-semana com amigos e ficámos alojados na casa de outros amigos, estudantes portugueses do último ano de medicina que estavam a fazer Erasmus em Madrid.
Contaram-nos como foi estar num hospital a trabalhar naquele dia. Descreveram a onda de solidariedade dos médicos e enfermeiras, já reformados, que acorreram aos hospitais para ajudar no que fosse preciso. E ainda, para consternação dos meus sensíveis ouvidos de mulher das letras, como se cosiam orelhas a sangue frio no corredor do hospital.
Explicaram como ficaram aturdidos com tudo aquilo, sem perceber exactamente o que se tinha passado. Têm um amigo que estava a trabalhar num hospital em N.Y. no dia 11 de Setembro. Perceberam, nesse dia, muito do que ele lhes tinha contado.
Fui de férias à Tunísia o ano passado, e, numa daquelas inenarráveis excursões que toda a gente faz, almocei com um grupo de madrilenos que, passado o primeiro momento de “small talk”, contaram, visivelmente comovidos, como foram aqueles momentos em que só se pensa em pegar no telefone e perguntar “estás bem?” às pessoas de quem mais se gosta.
Falaram daquele redimensionar algo psicossomático, tão compreensível nestas situações, dos vários planos da nossa vida, de como tudo parece reduzido ao que mais importa, mas em que menos se pensa em todos os outros dias.
Perderam amigos. Sentiram-se desprotegidos, vulneráveis e injustiçados perante toda aquela barbárie sem nexo, sem sentido, sem porquê.
É estranho ouvir contar o que sentem as pessoas que estiveram in loco aquando de um atentado terrorista. Parece surreal, distante, mesmo quando é aqui ao lado. Não se acha possível, verosímil que alguém acorde de manhã, apanhe um comboio, e acabe a ir pelos ares, ou que alguém esteja num edifício de escritórios em mais um dia de trabalho (igual a tantos dos meus) e tenha que, paradoxalmente, saltar para a morte para tentar salvar a vida.
É o imponderável da coisa que assusta.
Mas o medo é a única opção que não temos.