segunda-feira, abril 04, 2005

Post de merda

Se há coisa que pode orgulhar um verdadeiro “gajo” é a sua capacidade de fazer cocó. De facto, momento verdadeiramente sagrado é aquele “tempinho” despendido no trono. Fazer cocó é tudo menos banal, e não pode ser qualificado como simples necessidade fisiológica: É uma arte que vamos aperfeiçoando ao longo da nossa vida, até chegar àquele momento em que estamos em perfeita sintonia com os nossos intestinos.
Pobres daqueles que, em busca do “momento”, necessitam de recorrer a todo o género de produtos, naturais ou artificiais, para poderem sentir-se “verdadeiros gajos”. Dos kiwis aos reguladores da flora intestinal - à venda em qualquer farmácia, hipermercado ou posto de abastecimento -, estas pessoas procuram, por todos os meios, ter sucesso e atingir o almejado estatuto de “cagador”.
Há várias atitudes a ter perante o trono. Há aqueles que, depois de um dia infernal no escritório, chegam a casa e deparam-se com uma vida familiar igualmente infernal. Para estes, que costumam demorar cerca de uma hora no trono, o “momento” é como que a única altura do dia em que estão verdadeiramente em paz consigo próprios e, indirectamente, com os outros.
Outros há que aproveitam o “momento” para por a leitura em dia. Da revista “Maria” comprada pela empregada ucraniana ao “Anjos e Demónios” de Dan Brown, tudo serve para acompanhar devidamente o terceiro cigarro mais saboroso do dia (a seguir ao cigarro do depois-do-almoço e do depois-do-jantar). Apesar das diferenças, têm um ponto comum: Intitulam-se, orgulhosamente, de "caga-em-casa".
Estes dois géneros de “cagadores” são os verdadeiros amantes desta arte: Sabem apreciar devidamente aqueles minutos, minutos esses que podem, repentinamente, mudar as suas vidas – sim, porque é possível ser iluminado enquanto se faz cocó; é possível ter uma ideia sobre uma oportunidade de negócio peregrina, enquanto permanecemos, quase imóveis, naquilo que apelido de “atmosfera perigosa”.
Desde que comecei a trabalhar tenho-me deparado, infelizmente, com um terceiro tipo de “cagadores”. Sobressaltado pela descoberta acidental, apressei-me a estudar e teorizar sobre o assunto. Este terceiro género é por mim, reconhecida autoridade na matéria, composto por pessoas que, infelizmente, resolvem infernizar a vida das pessoas que, por manifesta necessidade fisiológica ou meramente estética, frequentam regularmente as casas de banho dos escritórios onde trabalham. Neste género podemos, facilmente, encontrar dois sub-géneros: Aqueles que só o conseguem fazer após o primeiro laxante (leia-se café) do dia, e aqueles que o fazem várias vezes por dia, em qualquer lado, como que a prestações – o que deixa transparecer uma certa apetência pelo recurso ao crédito ou qualquer modalidade atípica de financiamento. No fundo, são pessoas para quem as prestações, sejam elas de que natureza for, fazem parte integrante das suas vidas.
Este terceiro tipo de “cagadores” é, em regra, anónimo: Ninguém sabe, ao certo, quem eles são, apenas sabem que lá estiveram. Lamentavelmente, deixam a sua marca em toda e qualquer casa de banho por onde passam: São seres primários que não fazem a mínima ideia para que serve o piaçaba e desconhecem as mais elementares formas de atenuar o odor.
O cheiro é uma consequência natural do “momento”. É tão natural que só podemos neutralizá-lo artificialmente. No entanto, também neste capítulo há diferenças gritantes: Os verdadeiros sábios acompanham o exercício intestinal com um ou dois cigarros o que, a final, deixa um aroma menos intenso, mas acaba por deixar as paredes das casas de banho meio amareladas. Os inexperientes usam os vaporizadores, mas é sabido que este tipo de produtos contem substâncias altamente cancerígenas (ainda mais que os cigarros e as latas de tinta utilizadas anualmente para pintar a casa de banho juntos). A única solução (saudável) é abrir a janela e impedir qualquer pessoa de entrar na casa de banho nos 45 minutos subsequentes à descarga.
Também nesta actividade há certos deveres deontológicos a cumprir. Para bem da urbanidade e cooperação que deve reger esta classe profissional, urge codificar e sistematizar os princípios e regras que devem nortear esta actividade. Fica aqui, portanto, um apelo ao nosso legislador – que, pela forma como legisla, enquadra-se perfeitamente no terceiro género de “cagador”.
Como toda e qualquer arte que se preze, a arte de fazer cocó é constantemente alvo de infâmias Aqueles que lhe querem mal – os maus -, normalmente fiéis seguidores de outras artes, leigos da matéria, continuam a associar o cócó à flatulência. Embora intimamente ligados, não podemos cometer a ousadia de associar o “traque” ao “cocó”. Parte da Doutrina Internacional que partilha deste entendimento refere que o “traque” é como que o momento imediatamente anterior ao “cocó” dele fazendo, portanto, parte integrante ou, pelo menos, questão prejudicial.
No entanto, e salvo melhor opinião, o “traque” e o “cocó” são compartimentos-estanques; completamente autónomos. Normalmente, um bom “cagador” apenas dá traques para se divertir – isolada ou conjuntamente, e um bom “traquejador” apenas faz cocó quando os seus traques começam a ficar desvirtuados.
Há, no entanto, um momento no qual é impossível separar as águas: Quando um “cagador” assume a posição de ataque, é inevitável que solte uns quantos traques. Todavia, não o faz voluntariamente, pelo que não podem os apologistas da tese da condensação acima descrita, aproveitar-se deste facto natural para sustentar a sua tese. Se assim fosse, e porque também é normal deixar escapar uns gemidos ou grunhidos enquanto se faz cocó – gemidos e grunhidos esses exclusivamente derivados do esforço muscular -, teríamos, forçosamente, que associar os “gemedores” e/ou os “grunhidores” à classe dos “cagadores” o que, naturalmente, está fora de hipótese.
Podia começar a dissertar sobre as diferenças entre as loiças sanitárias “Roca” ou “Valadares”, mas abstenho-me de fazê-lo por amor à Pátria...